quinta-feira, 13 de agosto de 2009

Uma história que ainda não fazia parte da crônica policial

A Polícia Civil investiga um caso surpreendente: a vendedora Lidiana Severo teria negociado a própria morte. O ambulante Ricardo do Nascimento teria recebido R$ 500 para cometer o crime, a pedido da jovem

Ana Mary C. Cavalcante
anamary@opovo.com.br
Landry Pedrosa
landry@opovo.com.br
13 Ago 2009 - 00h11min


Lidiana Severo de Oliveira, 30, era uma jovem bonita, estava namorando e gostava de frequentar as festas do Órbita Bar (Praia de Iracema) e da Biruta (Praia do Futuro). Trabalhava como vendedora em uma grande concessionária de veículos de Fortaleza, há quatro anos. Tinha uma boa conversa, um Corolla e uma casa de praia na Taíba (litoral oeste). Tinha ainda, pelo menos, uma centena de amigos no Orkut (site de relacionamentos). Sem contar a mãe, a filha, as primas, a família, enfim, que a cercavam de abraços e risos. “Sempre foi uma pessoa, extremamente, extrovertida. E amiga de todos”, declara um dos chefes de Lidiana, que pediu para não ser identificado. Mas, quando faltou ao trabalho, na última segunda-feira, Lidiana haveria decidido morrer.

“Na manhã do dia 10 de agosto”, narra o delegado Andrade Júnior, titular da Divisão Anti-Sequestro da Polícia Civil (DAS), ela parou o Corolla na avenida Rogaciano Leite, quase esquina com a avenida Murilo Borges. O ponto de vendedores ambulantes, próximo à comunidade do Lagamar, é também marcado por histórias de assaltos. Ali, Lidiana “comprou uma capa de celular e, conversa vai, conversa vem”, segue o delegado, teria feito uma proposta surpreendente: oferecera R$ 500 para quem a matasse. “E ele, conhecido como Ricardo Moiteiro, se habilitou”, aponta Andrade Júnior. “Às 10 horas e 51 minutos”, registra, as câmeras do Controle de Tráfego em Área de Fortaleza (CTAFOR) mostram o ambulante entrando no Corolla de Lidiana.

Ricardo do Nascimento Alcântara, 40, vende o do dia, na avenida Rogaciano Leite, enquanto não aparece serviço de pedreiro. “Trabalhando todo dia, o mês todo”, calcula, consegue uns R$ 600 de renda. É “junto há uns 13 anos”, como diz do casamento, tem um par de filhos e ficha limpa na polícia. Nenhum antecedente criminal. Segunda-feira passada foi a primeira e última vez na vida que viu Lidiana. “Por que você a matou?”. “Não sei”, repete, distante. Aceitou os R$ 500 que ela teria lhe oferecido porque entende que todo dinheiro ajuda. Ele mesmo nunca tinha ouvido falar de um negócio desses, “sabia que uns pagavam pra matar os outros”. No breu que é a cela da DAS, Ricardo conta essa história ao O POVO. “Apenas peguei a arma e atirei”, ratificou ao delegado Andrade Júnior.

Até disparar os dois tiros, do banco do passageiro para a motorista, Ricardo passou o dia andando de carro com Lidiana. Primeiro, ele diz, a jovem teria lhe levado até a casa de praia, na Taíba. Lá, Lidiana lhe dera uma blusa para ele usar após o crime - caso houvesse manchas de sangue na roupa que vestia, ele poderia se desfazer da prova. Dali, rodaram pela zona rural de Caucaia (Região Metropolitana de Fortaleza). “Beberam, almoçaram juntos, conversaram - ela, dizendo que estava desgostosa da vida”, relata o delegado Andrade Júnior, a versão de Ricardo.

Bilhetes
Lidiana também teria recebido ligações, no celular. “De vez em quando, ela atendia. Dizia que era da família”, fala Ricardo, sem prestar atenção nas conversas da jovem ao lado. “Não sei, eu tava meio ‘tomado’ (segundo ele, haviam bebido ‘quatro, cinco cervejas’)”. Ainda de acordo com Ricardo Moiteiro, Lidiana teria escrito bilhetes para lhe inocentar do crime que cometeria. “Queimei”, revela sobre o destino das provas, porque um irmão teria avaliado que “aquilo iria me incriminar”.

Ricardo afirma ter tentado dissuadir Lidiana da morte. “Ela era bonita”, reconstitui. Mas a jovem vendedora “tinha uma conversa superior”. Quando Lidiana parou o Corolla no descampado, ela ainda haveria lhe orientado o caminho de volta até a pista. “Eu não conhecia nada ali”. Era por volta das 19 horas, no distrito de Tabuleiro Grande, quando Lidiana teria lhe dado o revólver calibre 38 e mandado Ricardo atirar.

Na “escuridão medonha”, voltando pelo caminho que ela apontara, ele arranjou uma carona de moto até o próximo posto de gasolina, onde pegou o ônibus de volta para casa. Daquela hora, não dormiu mais direito.

E-MAIS

>A morte da vendedora Lidiana Severo de Oliveira, 30, está sendo investigada pela Divisão Anti-Sequestro da Polícia Civil (DAS).

> O ambulante e pedreiro Ricardo do Nascimento Alcântara, 40, conhecido como Ricardo Moiteiro, foi preso, na última terça-feira, por policiais do Serviço de Inteligência do Comando-Geral da Polícia Militar e da Força Tática de Apoio da 4ª Companhia do 5º BPM.

> Ricardo “foi autuado em flagrante por crime de homicídio”, sintetiza o delegado Andrade Júnior. O titular da DAS ouviu a versão do ambulante e deve começar a obter o depoimento da família de Lidiana “quando passar o período do luto”.

> Ele ressalta que Ricardo “não tem histórico de uso de drogas”. A família de Ricardo, diz Andrade Júnior, teria lhe contado “uma história de problemas mentais, mas não apresentaram nenhum documento que comprove isso”.

> Dos R$ 500 que Lidiana teria pago, sobrou R$ 102. Junto com o dinheiro, a DAS recuperou o revólver, um par de brincos, o relógio, um cordão e o notebook da vítima. Ricardo contou ao O POVO que havia vendido o notebook por R$ 265.

fonte: O POVO online

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