1. É natural que, quando os governos enfrentam desafios de solução em médio e longo prazo, procurem criar fatos em curto prazo que despertem esperanças e criem a sensação de um processo em andamento. A ocupação de comunidades, nessa terceira etapa (a segunda foi o GPAE, sugerido em estudos com a ONG Viva-Rio, apoiado pela imprensa e experimentado no Pavãozinho e na Providência), é uma necessidade.
2. Mas a escolha de pequenas comunidades isoladas (Dona Marta, 4 mil pessoas; Babilônia, 2 mil pessoas) ajuda muito a produção de fatos e imagens. Mas não tendo economia de escala em outras comunidades conurbadas (como seria o caso da Tijuca, Alemão...) terminam por serem enclaves. A entrada e depois saída do Complexo do Alemão, este sim com amplo alcance, até hoje é inexplicável. O que foi daquela operação de guerra, com Força Nacional, trincheiras, abrigos de sacos de areia nas entradas de Nova Brasília e Grota...? Dizem que se tornou uma espécie de território livre de preocupação com a polícia. E foram várias semanas, com pelo menos 40 mortes informadas.
3. O equívoco em tratar o narcovarejo como atacado (pela experiência anterior do atual secretário na área de "inteligência" da PF), na busca de grandes paióis e depósitos que inexistem, num processo contínuo de recepção, endolagem batizada e venda, termina por decepcionar os informados e os experts.
4. O boom do crack, nos últimos meses, sublinha os fatos. Imagens de transformação de pseudo-cracolândias em pracinhas, e de detenção de um grupo de usuários nas ruas, que retornaram, segundo o secretário municipal da área social, no dia seguinte, com fotos e imagens na TV, terminam sendo o que sempre foram: enxugar a pia sem fechar a torneira. O aumento de 500% de crack apreendido indica que a circulação deve ter crescido nessa mesma proporção. Em 3 anos de governo é um fracasso de grande dimensão que a "inteligência policial" da equipe do secretário não conseguiu identificar. E aí, certamente poderia.
5. Agora vem a Operação Família SA, no Morro do Borel (7 mil habitantes), remindo ao traficante Isaias, preso há mais de 15 anos. Contas bancárias, celulares, apartamento..., tudo somado, que mal representa uns dias nessa boca de fumo de pequeno porte. Outro equívoco. Não que não se deva fazer. Deve-se. Mas criar a expectativa que se está afetando as "finanças" do narcovarejo é uma piada.
6. O narcovarejo não acumula capital para suas operações. As compras eventuais de imóvel e mesadas são a "previdência" dos familiares. Os traficantes têm a certeza de que até os 25 anos estarão presos ou mortos. A substituição é automática. Quem acumula e opera com capital de giro são os atacadistas -traficantes internacionais ou matutos, atacadistas internos.
7. A Operação Família SA (necessária para coibir o uso de dinheiro ilícito) produzirá imagens, mas nem arranhará o narcovarejo. Especialmente porque os traficantes nascidos e criados nas comunidades são cada vez mais peças raras na guerra pelos pontos de venda de drogas. Com a divulgação juvenil e desnecessária, produzirá violência como retaliação, que custará a vida de mais policiais. Sem qualquer resultado ou desdobramento. E espera-se não se tratar de uma Operação Sherman (general da guerra de secessão nos EUA), de aterrorizar a população civil para acelerar o fim da guerra. No caso, só intensificaria a violência e viriam novas cenas de terror.
8. Essa é mais uma ação em busca de melhorar as expectativas após o choque da derrubada do helicóptero da polícia. Mas quando se cria expectativas e as frustra, o desdobramento é mais pessimismo e incerteza. Políticas públicas equivocadas, independente das boas intenções, ocorrem com alguma frequência. O que cabe é reconhecer seu fracasso, rever o diagnóstico e propor uma Nova Política de Segurança Pública e Combate ao Narcovarejo. Sempre há tempo, e se for adequada, não há porque o próximo governador não mantê-la, seja qual for o seu partido.
fonte:Ex-Blog do Cesar Maia
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