segunda-feira, 13 de abril de 2009

ANCELMO GOIS


Ancelmo Gois é um cara que oscila entre o progressismo boêmio e um lacerdismo forçado. Isso porque dá para sentir que Gois é um cara "gente boa". Só falta a ele o mais importante: liberdade. Hoje ele publicou uma nota que me aborreceu profundamente.

A nota vem acompanhada de duas fotos da Lapa, junto aos Arcos. Na primeira foto, vemos várias barracas de camelôs vendendo salgado e bebidas, iluminadas, limpas, com pessoas circulando entre elas, tendo ao fundo os Arcos. Na segunda, tirada há cem anos, vemos os Arcos e, junto dele, dezenas de barracas de camelôs.

Até aí tudo bem. Qualquer ser humano racional concluiria que os ambulantes fazem parte da boemia lapiana desde priscas eras. Mas Gois escreve o seguinte: "Apesar dos cem anos de diferença, chama a atençao a presença de ambulantes, que levam caos ao bairro boêmio e angustiam comerciantes e autoridades."

Gois destila, nessa frase, um preconceito e uma estupidez indesculpáveis. Preconceito porque ele desconsidera que o vendedor ambulante seja também um "comerciante". Estupidez porque finge não entender que o "bairro boêmio" só é boêmio por causa de suas características, com a onipresença de ambulantes, que trazem luz, segurança e oferta de comes e bebes a preços populares.

A Lapa, senhor Ancelmo Gois, não é o Jobi, barzinho proto-fascista onde clientes comem dedos de outros por causa de suas opiniões políticas. A Lapa é um bairro de massas, onde todas as tribos se reúnem, a grande ágora carioca e quiçá brasileira. Com ambição de se tornar uma ágora mundial. Os ambulantes, todavia, são fundamentais, porque ocupam os espaços e trazem vida, alegria, luz e empregos para o bairro. Sem esquecer o principal: a liberdade. Talvez por isso o ambulante seja tão odiado pela classe média zona sul leitora de Globo, com sua mentalidade de empregado. O ambulante não é empregado de ninguém. Ele é pobre, ocupa um dos lugares mais baixos da hierarquia social, mas boa parte não gostaria de trocar seu trabalho por nenhum emprego em multinacional, porque eles desfrutam do maior bem: a liberdade.

Essa liberdade é sentida na Lapa. É uma energia que toma conta do bairro. Por isso, Gois, não seja estúpido. Não desrespeite o ambulante, que, como você viu, ocupa a Lapa há mais de cem anos. Matando o ambulante, vocês matarão a Lapa. Pode organizar, pode legalizar. A Associação de Ambulantes da Lapa está aí para isso. Eles querem organização e apoio do Estado. Querem pagar impostos, tudo certinho. Mas querem, sobretudo, respeito, tanto do Estado quanto da mídia. O que você fez, afirmando que eles "trazem o caos ao bairro boêmio" é uma imbecilidade indesculpável, porque ignora a formação histórica da Lapa, tanto antiga quanto recente, onde a presença dos ambulantes foi fundamental para a revitalização do bairro.

Entendo que Gois quer garantir seu emprego. Nada melhor para agradar seus patrões do que criticar camelô. Se tiver interesse, entretanto, em garantir o que ainda resta de seu prestígio junto a seus leitores, terá que rever sua visão sobre a Lapa e seus ambulantes.
# Escrito por Miguel do Rosário # Terça-feira, Fevereiro 17, 2009

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