André  Balocco, Jornal do Brasil
 
RIO DE JANEIRO - O drama de  familiares dos usuários de crack no Rio pode estar com os dias contados.  Dentro de um projeto que começa a mudar o foco do uso de drogas de  questão de segurança pública para questão de saúde, o estado começa a  preparar o antigo Hospital São Sebastião, no Caju, até então  especializado em doenças infecciosas, para se transformar num hospital  de referência no país no ao tratamento de dependentes químicos de 10 a  17 anos de idade.  
O pontapé inicial foi dado na segunda-feira  passada, quando os secretários José Mariano Beltrame (Segurança), Sérgio  Cortes (Saúde) e Tereza Porto (Educação) visitaram a sede do antigo  hospital – fechado desde o ano passado – e trocaram ideias comuns na  batalha contra a dependência química. 
A meta é integrar as  três secretarias para ajudar na  recuperação do usuário que busca a sua recuperação. O centro receberia  crianças e adolescente viciados em crack, e teria capacidade para  atender cerca de 40 pacientes. Os custos e o início das obras ainda não  foram definidos.
– As pessoas que usam drogas precisam de  tratamento e é isso o que vamos dar – explicou o secretário de  Segurança, José Mariano Beltrame  – O uso de drogas é questão de saúde  pública também. Não é mais só uma questão de segurança. O dependente  químico é um doente, e doente precisa se tratar.
A ideia é aproveitar o fechamento do  Credeq (Centro de Recuperação de Dependência Química), com atendimento  agora limitado a menores infratores em situação de risco com problemas  de drogas. O Credeq, antes de se transformar em órgão de apoio do  Departamento Geral de Ações Socioeducativas (Degase), era referência no  tratamento da dependência química no Rio, pioneiro no Brasil. Ao ser  transferido para o órgão da Justiça, deixou órfãos as pessoas que  precisam de tratamento mas não têm como pagar clínicas particulares. 
–  O hospital vai ser todo remodelado para cuidar dos dependentes químicos  – diz Beltrame.
A certeza de que as drogas se transformaram em  questão de saúde pública cresceu com a pacificação nas favelas ocupadas  pelas UPPs. Beltrame diz que o Estado precisa ocupar esta lacuna  primeiro para que, depois, abra-se um grande debate sobre a  descriminalização do uso de drogas.
– O estado só pode falar em  descriminalização depois de se estruturar para oferecer tratamento a  quem queira largar.
 Colaborou Marcelo Fernandes 
  Foco é mudar a política de tratamento em hospitais 
 José  Luiz de Pinho e Marcelo Fernandes 
A superintendente estadual  de Saúde, Mônica Almeida, afirmou, na terça-feira, que a transformação  do Hospital São Sebastião em centro nacional de referência ao tratamento  de dependência química tem um objetivo principal.
– Se tornar uma  política de enfrentamento à epidemia de consumo de crack, que toma  conta do Rio – afirmou Mônica – É um projeto intersetorial, envolve  várias secretarias de Estado, está em fase de construção, mas ainda não  tem uma data fixa para entrar em vigor.
Para o deputado estadual  José Nader (PTB), presidente da Comissão de Prevenção ao Uso de Drogas e  Dependentes Químicos em Geral da Alerj, a questão é tratada com  desinteresse pelo governo, em razão do tratamento para dependentes não  ter resultados visíveis imediatos.  
– O hospital a ser  criado proporcionará somente mais uma ação para o tratamento. Não vimos  até agora uma política de acompanhamento do dependente após sua saída  dos centros de tratamento. Não podemos esquecer que dependência química é  doença a ser tratada por toda a vida. O tratamento utilizado já  demonstrou não ser totalmente eficiente, já que o percentual  de reincidência é enorme. 
 Especialistas reticentes  sobre política do governo 
 Marcelo Fernandes 
Especialistas  na área de dependência química se mostraram otimistas com o anúncio da  nova clínica, embora lamentem a falta de investimentos similares no  trato com a doença.
Segundo a ex-diretora do Núcleo de  Estudos e tratamento da Uerj (Nepad), Maria Thereza de Aquino, o centro  será bem-vindo 
– Atualmente, não existe nada público que trate  adequadamente os usuários de drogas. O atendimento feito em ambulatórios  é feito de uma forma errada, já que o dependente precisa de um tempo  para se recuperar do vício. O período de internação praticado pelo SUS é  ridiculamente curto, não se trata um usuário em apenas 15 dias –  alerta. 
A opinião é compartilhada pelo médico José Jáber,  pós-graduado no tratamento de dependência química na Universidade de  Harvard.
– De uma maneira geral, é muito falha a ação das  autoridades na área do uso de drogas. É preciso chamar a atenção que a  política é de redução de dano não é algo que dê frutos. O ideal é que  você trabalhe a abstinência completa. 
Já o médico e ex-dependente  químico Alessandro Alves Teixeira ressalta a importância de existir um  tratamento transdisciplinar.
– Um ponto importante é a necessidade  de existir a internação involuntária, já que muitas vezes o dependente  não tem noção que está viciado.