quinta-feira, 19 de maio de 2011

Superação de limites é palavra de ordem no Bope

Além do treinamento ostensivo para situações de conflito, os policiais contam com o apoio de uma psicóloga
Jornal do Brasil


Famoso depois da série de filmes Tropa de Elite, o Batalhão de Operações Especiais (Bope) da Polícia Militar foi ainda mais elogiado depois da operação de retomada do Complexo do Alemão, em novembro de 2010. O sucesso da operação se deu pelo fato de os criminosos terem sido expulsos do local sem causar ao menos uma baixa na tropa.

Além do treinamento ostensivo para situações de conflito, os policiais contam com o apoio da psicóloga Bianca Sant’Anna Cirilo, responsável pelas instruções que incluem estímulo ao trabalho em grupo, controle emocional e à capacidade de superação. A preocupação com a saúde mental se dá desde o processo seletivo: a personalidade e as habilidades específicas de cada um são avaliadas para criar um perfil profissiográfico. A partir de testes de inteligência e habilidade específica, que aferem precisão, atenção e rapidez, é possível identificar que indivíduo se encaixa melhor em cada função.

Uma vez por mês, a psicóloga se reúne com as equipes da Unidade de Intervenção Tática – composta pelo grupo de retomada, os negociadores e os snipers – para debater distúrbios inerentes ao trabalho, como estresse. Episódios como o massacre de Realengo, que Bianca considera um acidente imprevisível, devido às características psicológicas do atirador, também são analisados durante as instruções.

O treinamento inclui até mesmo o estudo de práticas terroristas, situação pouco provável para a realidade brasileira, mas que ajudou os agentes do Bope na retomada do Complexo do Alemão.

- A doutrina clássica diz que não existe negociação com terroristas. Mas a partir desse comportamento, é possível avaliar cenários sociais delicados, em que a criminalidade dá uma resposta agressiva. Éimportante que a polícia esteja cada vez mais habilitada a lidar com esse tipo de situação. No dia da invasão, estive lá e vi agentes totalmente comprometidos com a missão. Muitos se esqueceram até mesmo da condição física para luar pelo ideal de recuperar a cidadania daquela população. A satisfação deles era visível e esse é um grande diferencial do policial do Bope, que tem uma relação quase terapêutica com seu trabalho. Minha função é dar retaguarda para que eles se sintam cada vez mais valorizados – acredita Bianca.

Treinamento para atingir excelência

A própria dinâmica do trabalho permite que os policiais tenham tempo para estudar as situações e desenvolver suas potencialidades, já que os episódios críticos não são frequentes. Por isso, Bianca acredita que não é preciso realizar um trabalho específico às vésperas de operações para a instalação de Unidades de Polícia Pacificadora, por exemplo.

- A formação deles é muito ampla. Quando o policial vai para a rua, já tem embutido na sua atuação dois fatores no qual se baseia meu trabalho: a capacidade de ser flexível em situações de zero a 100 (que, no jargão do batalhão, quer dizer diferentes ambientes) e a própria valorização do agente. A auto-estima de grupo é muito estimulada, além disso, enfatizamos que o treinamento é a ferramenta para a perfeição. Eles têm consciência de que podem fazer a diferença, e isso facilita o alcance dessa excelência que desejamos - avalia.

Na polícia militar há nove anos, Bianca assumiu o cargo de psicóloga em 2008. A maior dificuldade foi se adaptar à realidade do batalhão e pesquisar os perfis criminais listados pelo FBI, a polícia americana, e as estratégias de guerra israelenses para aprender a negociar o resgate de reféns. Além disso, investiu em uma pós-graduação em Psicologia Jurídica, um mestrado em Saúde e Coletiva e, agora, trabalha numa pesquisa sobre os métodos utilizados pela tropa de elite, tema de sua tese de Doutorado.

- Meu intuito é fazer com que a população entenda que a negociação é uma prática que resgata a cidadania do outro. Estamos acostumados a pensar na polícia armada, que já entra atirando, mas essa não é a única forma de agir. Nosso posicionamento está mudando, porque entendemos que precisamos atuar em parceria com a população, investir num policiamento de proximidade. Nossas ações são baseadas na inteligência e a polícia existe para servir e proteger. Esses são os valores que estamos tentando resgatar, mas é preciso que a sociedade também esteja preparada para esta transformação – conclui a psicóloga.


fonte: JB ONLINE

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